Na final da Copa do Mundo de 2002, entre Alemanha x Brasil, o time titular da seleção brasileira foi formado por Marcos, Cafu, Lúcio, Roque Júnior, Edmílson, Roberto Carlos, Gilberto Silva, Rivaldo, Ronaldinho Gaúcho, Kléberson e Ronaldo. Entre esses 11 nomes, somente um continua em atividade no futebol, o capitão do Brasiliense, Lúcio.

Em entrevista exclusiva para o DF Sports, o zagueiro nos contou sobre os amigos que mantém dessa Seleção, histórias sobre aquela Copa no Japão e Coréia do Sul, deu sua opinião sobre o que aconteceu com o Brasil nas Copas de 2014 e 2018, falou sobre a convocação para os amistosos, o sonho de vencer um título pelo Brasiliense e sobre aposentadoria. Veja a entrevista na íntegra:

DFS: Lúcio, você é único jogador do time titular da Seleção campeã do mundo de 2002 que ainda está jogando. Como você está se sentindo?

Eu estou me sentindo bem. Voltei a jogar em 2018. Em 2017, eu fiquei parado por conta de uma cirurgia. Ano passado ainda foi um pouco difícil até eu voltar ao ritmo de jogo, de treinamento e hoje eu tô me sentindo bem, graças a Deus. Melhor fisicamente e também já estou melhor do meu pé da cirurgia. Eu fico feliz e muito grato a Deus por ter me dado saúde, capacidade e disposição para treinar todo dia e isso já faço há mais de 20 anos. Tenho alegria em poder jogar e pretendo continuar jogando enquanto isso tudo durar. Quando não tiver mais a mesma alegria e a mesma disposição, é que chegou a hora de parar.

DFS: Você ainda tem contato com os jogadores daquela Seleção? Quais?

Tenho. Hoje em dia, através das redes sociais, a gente acaba se encontrando mais, tendo mais contato, se falando mais e em viagens e eventos a gente pode se encontrar. Isso é muito interessante, porque nos dá uma satisfação, uma alegria de rever amigos que conquistaram um mérito muito honrado para o nosso país e isso, sem dúvida, nos deixa feliz de saber que nós conseguimos realizar um proeza e deixar o nosso país tão orgulhoso como foi em 2002.

Falo mais com o Cafú, com o Kaká, Gilberto Silva, com o Marcão (goleiro), Edmílson, Roque Júnior, Ronaldinho Gaúcho, também. A gente está sempre se encontrando nos eventos e se falando pelas redes sociais, WhatsApp. O mundo de hoje acaba aproximando todos.

DFS: E eles já te visitaram aqui?

Não, aqui ainda não. (Risos) O pólo maior é São Paulo, então eu estou sempre indo lá e a gente se encontra por lá.

DFS: Antes de vir pra Brasília, você estava na Índia. Foi um desejo seu voltar pra casa?

Foi, sim. Eu estou ficando mais velho e não tenho as mesmas opções que antes. Primeiramente, eu voltei no Gama, no ano passado, e eu estava no período de readaptação. E depois, eu escolhi o Brasil porque é um time de tradição da cidade, que antes eu já tinha tido algum contato com eles e, infelizmente, não tinha fechado um acordo. Fica próximo da minha casa, da minha família e eu estou muito feliz aqui. Sempre quis retornar a jogar em Brasília, perto dos meus pais, meus irmãos, meus tios e meus primos, e agora isso ficou mais viável.

DFS: No último título que o Brasil conquistou pela Copa você estava lá e também estava nas duas edições seguintes, 2006 e 2010, mas as de 2014 e 2018, você só assistiu. Qual a sua opinião sobre a atuação da Seleção? O que mudou do elenco de 2002 pro atual?

Muita coisa. Eu posso falar com autoridade da de 2002, que a gente acabou conquistando o título. Era uma Seleção bem mais focada, unida, que tinha como ponto principal o jogo coletivo e esse foi o diferencial. Naquele momento, o treinador (Felipão) estava numa disposição muito grande, tinha uma preocupação de fazer o time jogar, de vencer, e esses são os principais pontos. Não teve vaidade, individualidade… Não tinha a questão de querer chamar atenção para si. Eu acho que aquele grupo mereceu ser campeão pela qualidade que teve. Pelo empenho, a responsabilidade e, principalmente, pela união e humildade.

Olhando de fora, o que faltou muito em 2014 e 2018 foi isso. Houve muito a questão da individualidade, do ritmo, do clima de festa, do “já ganhou”, principalmente em 2014. A gente se via de uma forma muito além dos limites. A questão de aparição dos jogadores durante as competições, muita informação, um acesso muito fácil tanto da imprensa quanto dos patrocinadores, como amigos e famílias na concentração. Querendo ou não, isso durante a competição tem de ser controlado. Quando isso não acontece, acaba sendo penalizado (dentro de campo).

Muitas vezes os torcedores perguntam o que aconteceu, o que houve no 7 x 1, mas aquilo foi só o acúmulo de tudo. De uma má preparação; de euforia; de pensar que já estava ganho; de pensar que seria fácil porque estava no Brasil. Esse jogo (Brasil x Alemanha) resumiu bem o que aconteceu durante a preparação e o foco da Seleção Brasileira, que não estava voltado somente para o futebol. Eu sou de uma geração um pouco mais antiga (disse rindo), claro que hoje em dia, com Instagram, WhatsApp, as redes sociais em geral, acabam, de alguma forma, exigindo que o jogador esteja sempre postando alguma coisa, focado em outra coisa. Eu acho que, quando se trata de uma Copa do Mundo, vale a pena você esquecer muitas coisas lá fora para ir em busca de um objetivo que marca a vida de todo mundo.

DFS: Em 2018 aconteceu a mesma coisa que em 2014? Tinha uma expectativa muito grande. Mudou o técnico, outros jogadores foram convocados…

Eu acho que, em 2018, por ter sido fora do Brasil foi um pouco diferente, mas acredito que ainda faltou união e estratégia, principalmente naquele jogo contra a Bélgica. A Seleção poderia ter sido mais humilde, ter reconhecido os pontos fortes da Bélgica, que era a bola aérea, o contra-ataque e a marcação forte. Acho que o Brasil foi negligente nessa partida. Tinha que ter um pouquinho mais de humildade reconhecendo as qualidades do adversário e tentar marcar. Foi isso que faltou em 2018.

DFS: Tem alguma história interessante para contar da Copa do Mundo de 2002?

Tem algumas. A gente estava na concentração, não lembro em qual cidade, mas o Japão é marcado por alguns terremotos. Numa ocasião, em torno de 23h e 00h, o nosso hotel balançou e foi muito engraçado. Todo mundo saiu correndo dos quartos, de pijama ou de cueca, e tentou descer, mas os guardas que tomavam conta da comissão não deixaram. Falaram que estava tudo bem, que não era nada e já tinha um aviso que aquilo ia acontecer. Naquela noite todo mundo dormiu muito pouco por conta disso. E várias outras coisas aconteceram. A gente sempre brincava.

Como eu jogava na Alemanha (no Bayer Leverkusen), eu sempre passava instruções para alguns jogadores. Teve uma falta no jogo da final e o jogador que ia bater jogava comigo no Bayer e eu via que ele chutava muito bem,e avisei ao Marcos. Foi justamente o Neuville (número sete da seleção alemã) que chutou, o Marcão conseguiu defender e a bola ainda bateu na trave. Quando chegou no vestiário, ele me deu um beijo no rosto, me abraçou e agradeceu, porque se eu não tivesse avisado, provavelmente ele teria tomado o gol. São essas coisas assim de companheirismo, de amizade, que acaba formando um grupo forte e o resultado é o título.

DFS: Com certeza esse elenco criou uma relação de proximidade com o Felipão. Como é ver ele, depois daquele 7 x 1, voltando a treinar no Brasil e ainda conquistar o título do Campeonato Brasileiro?

A gente fica feliz. Ele pegou um grande clube, um dos maiores investidores hoje no país. Aquele 7 x 1 acabou manchando a carreira dele e de todos que estavam ali naquele grupo, aquilo dificilmente acontece em uma Copa, acho que nunca aconteceu com uma grande seleção, jogando em casa, com o favoritismo. Mas agora ele tem novamente chances de conquistar grandes títulos no Palmeiras e seguir a vida, olhar pra frente, com novos objetivos e tentar esquecer o que aconteceu em 2014.

DFS: Em junho começa a Copa América, com o primeiro jogo do Brasil em 14 de junho, contra a Bolívia. Qual é a sua expectativa da Seleção na competição? E quais jogadores você acha que devem ser convocados pelo Tite?

Pra mim, falar de jogador é mais difícil. Independente da grandeza da competição, que nem se compara com uma Copa do Mundo uma Copa América, mas por tratar-se de Seleção Brasileira, jogando no nosso país, acho que a obrigação do Brasil é ganhar. Eu diria, na verdade, que a obrigação é de jogar bem, de ter um grupo forte e honrar a camisa. O Brasil nem sempre consegue ganhar as competições, mas o mais importante é deixar o torcedor orgulhoso, feliz com o futebol.

Sobre jogador, no momento é muito difícil, até porque a gente não sabe se vai ter teste para novos jogadores pois, sempre depois de uma Copa perdida, há muita renovação para o objetivo maior que é a próxima, de 2022. Então, a gente fica na torcida e espera que o Brasil possa ter um bom desempenho.

DFS: (Ele disse que ainda não estava sabendo dos jogadores chamados para os amistosos.) O Lucas Paquetá, o Vinícius Júnior e o Éder Militão estão na lista. Você acompanha o futebol deles?

Eu acho que vão ser novos testes na Seleção Brasileira. É claro que são dois grandes jogadores (falando sobre a ex-dupla do Flamengo), que há pouco se transferiram para grandes clubes na Europa e vão acabar adquirindo uma grande experiência. Mas o torcedor brasileiro quando vê a amarelinha em campo quer ver resultado. A gente espera que eles possam dar conta do recado. Vai ser uma vantagem para eles de ser no Brasil e ser uma Copa América, onde não tem muita pressão, mas essas convocações já são condicionadas para ver o que se tem para a próxima Copa do Mundo.

Sobre o Militão, acompanho muito pouco, mas acredito que para estar na Seleção tem que merecer, tem que ter mostrado um bom futebol. E também é um jovem, que pode estar em 2022.

DFS: Falando do presente, você é titular absoluto na zaga do Brasiliense, que é a única que ainda não tomou gols no Brasil. Como está sendo esse momento?

É um momento de satisfação. A gente começou o trabalho aqui dia 19 de novembro e o grupo é muito bom, muito unido, com uma harmonia legal e eu acho que tudo isso contribui para que bons resultados aconteçam. Um dos resultados positivos é esse: ainda não fomos vazados e estamos brigando na ponta da tabela. Isso nos deixa satisfeitos. É fruto do trabalho que a gente já vem fazendo lá atrás (pré-temporada), mas claro que a experiência, a competitividade, também ajudam muito. Quando entramos em campo é sempre com o pensamento de vencer, de doar o melhor para o Brasiliense, para que no final possamos sair satisfeitos, com a vitória ou não, mas pelo menos felizes com o desempenho. Para a gente, é importante manter a regularidade de um defesa compacta, forte e sólida, para que possamos dar segurança para o meio de campo e o ataque ficarem mais tranquilos.

DFS: Em caso de título no Candangão, vai ser diferente o sentimento de levantar uma taça em casa?

O sentimento de ser campeão é sempre bom. É claro que vai ser diferente, porque é na minha cidade, é um momento especial e cada dia que passa fica mais próximo o fim da minha carreira, mas eu espero que a nossa equipe possa ser abençoada por Deus e ter a competência de trabalhar para merecer conquistar o título. A gente não pode ficar só na torcida e no pensamento positivo. Temos que trabalhar muito e fazer por merecer para ser campeão.

DFS: Você comentou sobre o fim da carreira estar próximo e sobre estar mais velho. Já passou pela sua cabeça a ideia de se aposentar?

Já. É claro que, quando passamos por alguns momentos estressantes, algumas dificuldades, tanto dentro quanto fora de campo, às vezes a gente para pra pensar e acha que chegou a hora, até porque muitas vezes não precisa passar por aquilo por tudo que o futebol já me deu. Quantos jogos na Seleção, em grandes clubes na Europa… E algumas situações chatas acabam tirando um pouco a paciência e a paz. Então, muitas vezes, nesses momentos, a gente pensa em deixar de jogar, mas o amor pelo futebol sempre fala mais alto e a gente continua na luta

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