Por André Gomes e Luiz Fernando Santos

Conforme recomenda o Ministério da Saúde, a prática de esportes faz bem tanto para o corpo como para a mente. Entretanto, praticar atividades físicas é algo que se vê cada vez menos nas universidades e faculdades de Brasília. Dos mais de 50 centros de ensino superior do Distrito Federal, apenas cinco são filiados à Federação do Esporte Universitário do Distrito Federal (Fesu-DF). São eles: Centro Universitário Iesb, Centro Universitário Icesp, Faculdade Mauá, União Pioneira de Integração Social (Upis) e a Universidade de Brasília (UnB).

Menos de 10% dos centros universitários do Distrito Federal apoiam alguma prática esportiva

O DF Sports+ procurou quatro instituições do DF (duas filiadas e duas não filiadas) para tentar saber um pouco mais sobre o que elas têm feito a respeito da inserção do esporte no cotidiano dos alunos.

Unip

A nossa reportagem procurou informações sobre a parte esportiva da Universidade Paulista (Unip) campus Brasília, mas a coordenação informou que não há um setor responsável pela área de esportes na sede do Distrito Federal, e que são as próprias atléticas dos cursos que se organizam para a prática das modalidades.

Os alunos se mostram incomodados com a postura adotada pela universidade acerca do incentivo ao esporte. Para o estudante de Jornalismo Leandro Henrique, a universidade deixa a desejar. “No aspecto de apoio esportivo, infelizmente, há uma grande escassez. A única coisa que possui em relação a esportes são as atléticas, que são organizadas pelos próprios alunos. Há muita falta de campeonatos internos e formação de equipes para disputas entre universidades”, revela.

O ex-atleta de futebol Braian Bernardo, que também é aluno da Unip, considera que o esporte é essencial para o desenvolvimento humano, devendo ser estimulado desde a infância, mas a falta de estrutura ainda de colégios públicos limita e até impede o surgimento de um novo atleta. “A infraestrutura que as escolas públicas — onde eu estudei desde sempre — é muito precária”, lamenta.

Eu nunca joguei tênis, por exemplo. Talvez eu tenha talento. Como eu vou descobri-lo, sendo que eu nunca fui incentivado a isso?!

Braian Bernardo, estudante de Jornalismo

Amigos, Leandro e Braian já tentaram montar um time para disputar competições pela universidade, mas se depararam com a falta de incentivo e burocracia dos responsáveis. “Já tentamos organizar um time de futsal e não obtivemos sucesso, pois a faculdade não permitiu.” Os estudantes foram informados que só poderiam fazer isso por meio de atléticas e por conta própria, sem fundos ou incentivos monetários da Unip.

Procurada, a Universidade Paulista não comentou a respeito da falta de incentivo reclamada pelos alunos. Não há, também, um departamento e/ou funcionário voltado para tratar de esportes.

UniCeub

Quando se vem à mente o logotipo do Centro de Ensino Unificado de Brasília (UniCeub), muita gente já associa ao esporte, muito pela parceria multicampeã com o Basquete Brasília, que durou sete anos. Porém, a instituição não tem projetos estabilizados na área esportiva atualmente.

É fato que o UniCeub dispõe de uma estrutura esportiva no campus da Asa Norte (piscina, campo e ginásio) para uso dos alunos. No entanto, não há nenhum acompanhamento ou orientação de treinamento. O centro universitário também não fomenta os Jogos Universitários (JUBs) entre os estudantes, que poderia possibilitar a criação de equipes para a disputa da competição.

Bolsas de estudos para atletas não são oferecidas. Mesmo nos tempos de Brasília Basquete, onde a marca “Ceub” era estampada no naming rights da equipe (quando uma marca/produto integra seu nome à uma organização — neste caso, o Brasília), nenhum dos jogadores recebiam incentivo financeiro para estudar na universidade.

Por muito tempo, o nome “Ceub” fez parte do Basquete Brasília. Foto: Julianne Belo

A exemplo da Unip, os estudantes também sentem falta do olhar mais atento à questão esportiva. Renato Coelho, 20, está no quarto semestre de Jornalismo e lamenta não poder conseguir praticar alguma modalidade pela instituição. “Logo procurei me informar se havia algum time ou coisa do gênero e fiquei frustrado quando soube que não. Sou aluno há dois anos e, realmente, nada se vê sobre esportes”, comenta.

Mateus, 19, também do curso de Jornalismo, conta que os alunos sempre se manifestam junto a diretoria, reivindicando que o esporte seja tratado com olhar atento. “Sempre que há os conselhos, é pedido pela representante da turma para que haja maior preocupação em relação a isso, mas nunca somos atendidos”, explica.

Em contato com a reportagem, o UniCeub afirma que “dispõe de toda a sua estrutura esportiva para os alunos”. O centro universitário afirma, também, que incentiva projetos esportivos junto à comunidade. “Um deles leva crianças e adolescentes com obesidade para praticar atividades físicas orientados pelos alunos do curso de Educação Física”, menciona. Por fim, a instituição atesta que não oferece bolsas de estudo para atletas. “Também não temos equipes no JUBs”, finaliza.

UnB

Indo na contramão de algumas universidades particulares, a Universidade de Brasília (UnB) conta com bons investimentos na área esportiva. Mesmo sem verbas fornecidas pelo Ministério do Esporte, a diretoria da área utiliza dos recursos da própria universidade para promover ações, projetos e pesquisas com foco no esporte universitário.

A diretoria afirmou que preza pelo investimento igualitário: toda a verba disponibilizada é dividida uniformemente para cada esporte reconhecido pela Confederação Brasileira de Desportos Universitários (CBDU). A ação permite que os esportes se desenvolvam proporcionalmente, sem que alguma modalidade fique à frente das outras no que diz respeito a recursos financeiros.

Mesmo em tempos de contingenciamentos, UnB nunca abdicou de apoiar o esporte e o esportista. Foto: Bruna Braz

A universidade também participa de editais para programas do governo. Um exemplo é o programa Segundo Tempo Universitário. Para o diretor da diretoria de Esporte e Lazer da UnB, Alexandre Rezende, é uma forma de investir em ações esportivas dentro da própria instituição. “Os estudantes vão receber capacitação e vão desenvolver oficinas esportivas. Cada núcleo atende a cerca de 300 estudantes. Nós temos três núcleos, então, 900 estudantes serão atendidos pelo programa”, comenta.

Outros três projetos são desenvolvidos na instituição. São eles:

  • O Bolsa atleta, onde cerca de 120 bolsas de R$ 400 são disponibilizadas aos competidores por ano;
  • O Auxílio Viagem Individual (AVI), que utiliza recursos para cobrir custos de transporte, hospedagem, alimentação, medicamentos e até equipamentos esportivos dos alunos atletas;
  • O programa de oficinas esportivas para a sociedade, onde, além de investir nos competidores, a UnB proporciona atividades para a comunidade externa.

Mesmo com um espaço relativamente grande, ele ainda não é suficiente para atender a demanda de atividades no campus. Na busca de impedir que os atletas não fiquem sem local ou tempo de treino, a universidade faz parceria com os Institutos Federais de Brasília (IFB), que disponibilizam equipamentos, ginásios e quadras para manter os competidores na ativa.

Segundo Alexandre, é importante manter as duas áreas funcionando, tanto a do esporte de alto rendimento, quanto a do esporte para a comunidade. “Nós temos tentado distribuir os recursos de maneira equilibrada, entre os esportes de representação e o esporte comunitário. A nossa política é equilibrar os investimentos dentro dessas duas grandes ações”, esclarece.

Todo o esforço feito pelos responsáveis deu à UnB a segunda colocação no troféu eficiência do CBDU, que reúne os rankings de todas as modalidades presentes na confederação. O esporte melhor rankeado é o handebol, tanto masculino, quanto feminino.

Investimento dá resultado: UnB coleciona troféus em várias modalidades

Upis

Com a filosofia de que o esporte é a melhor ferramenta na preparação para o mercado de trabalho, a União Pioneira de Integração Social (Upis) mantém ativo vários projetos voltados para os esportes universitários, incluindo bolsas para atletas. Hoje, dentro da instituição, cerca de 210 alunos recebem desconto para integrar alguma das equipes em diversas modalidades coletivas e individuais, como futsal, basquete, vôlei, hipismo, natação, judô, entre outros.

Conhecida no meio esportivo principalmente pela equipe Upis Vôlei, que disputa a Superliga B Masculina, a instituição se orgulha de manter um projeto há quase duas décadas, fazendo frente aos grandes centros universitários de Brasília. “Ao longo desse período, algumas faculdades de Brasília, grandes e pequenas, pontualmente dão bolsa e param, e só a Upis se manteve todo esse tempo investindo em atletas universitários, mesmo sendo uma faculdade de tamanho médio”. Destacou o diretor do setor de esportes da Upis, Flávio Thiessen, que está à frente do projeto durante todos os 17 anos.

Universidade vai na contramão de outros centros do DF. Foto: Divulgação

Ao longo desse período, a Upis já montou uma parceria com o time profissional de futebol do Paranoá Esporte Clube em 2016 e 2017, onde os atletas recebiam bolsas para estudar. Mais recentemente, fez o mesmo com a Aruc, no futsal masculino; com o Brasília Vôlei, no vôlei feminino; e com o Cerrado Basquete, onde além dos descontos na universidade, os atletas disputam os JUBs pela Upis e os torneios federados pelo Cerrado.

Camisa da comissão técnica de 2019 do Paranoá com a logo da Upis. Foto: Divulgação

Esse envolvimento com a prática esportiva, embora foque no desenvolvimento de atletas de alto rendimento, também caminha para o lado social. A maioria dos grandes esportistas é oriunda de camadas mais baixas da sociedade e, olhando para esse cenário, a Upis, através do acesso dado ao estudo, não possibilita apenas que o aluno tenha condições de treinar em uma estrutura adequada, mas também entrega uma formação profissional para a vida pós-atleta, pois a carreira costuma ser muito curta. É o que explica Thiessen no áudio:

O diretor destaca que outro ponto fundamental para que ele enraíze a cultura esportiva dentro da universidade é a experiência de disputar um campeonato. Para ele, é algo que uma pessoa só consegue adquirir com a competição, e não dentro de uma sala de aula. O diretor se embasa em um estudo americano sobre as valências que o desporto leva para a vida profissional.

“O esporte ensina, naturalmente, algumas coisas. Aprender a lidar com a frustração, a resiliência, obedecer a regras e respeitar hierarquia, sentido de equipe e coletividade, o sacrifício de treinar pra baixar um segundo na natação, por exemplo”, argumenta Thiessen.

Uma pessoa que foi campeã com o estádio cheio batendo um pênalti aos 44 minutos vai amarelar em uma reunião? O cara que perdeu o jogo e no outro dia está treinando, ele vai reclamar que trabalhou uma hora extra de no serviço? São coisas que o esporte traz para a vida.

Flávio Thiessen, diretor do setor de esportes da Upis

A Upis não tem uma estrutura em seu campus principal na Asa Sul com ginásio ou campo. Todo o treinamento dos atletas acontecem nas instalações das instituições parceiras (futsal na Aruc, basquete nas quadras do Cerrado, etc). A universidade irá fechar, em breve, uma parceria com a academia de judô Tranquilini para montar um tatame dentro de uma sala de aula, onde todos os alunos, independente de querer competir ou não, poderão praticar a modalidade. 

Nem tudo são flores

Mesmo com todo o investimento, algumas barreiras dificultam o processo do projeto esportivo dentro da instituição. As bolsas são oferecidas para alunos que já estudam na faculdade. Este ano foi a primeira vez que a universidade realizou uma seletiva com não-estudantes para a equipe de vôlei, buscando renovar o plantel. No entanto, a procura tem caído e, mesmo para as modalidades individuais, às vezes é preciso fazer seletiva. Flávio comenta que a vida corrida que os alunos levam nos dias de hoje e a oportunidade de estudar fora de Brasília têm contribuído para a redução do número de estudantes interessados no esporte.

A concorrência — ou a falta dela — também é um fator preocupante no desenvolvimento do projeto. Como a maioria das universidades do Distrito Federal não têm investimento no esporte, em muitas modalidades a Upis é a única participante nos Jogos Universitários do DF (JUDF) e acaba se classificando para os JUBs sem precisar jogar. Isso acaba afetando a visibilidade da marca e a captação de recursos.

One thought on “O contraste de incentivos das universidades de Brasília no esporte

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *